sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Uma Árvore de Memórias



Estás sozinha na escuridão, dentro da tua própria mente. Interiorizas, procurando alcançar um caminho que te possa levar a uma solução, a uma resposta para justificar o momento que estás neste momento a viver. 

A resposta que procuras, no entanto, está muito longe. Escondida a uma grande profundidade na tua mente, em recônditos de dificil acesso, mesmo para ti, que muitas vezes és dela prisioneira. 

Os teus olhos fecham-se, mas não deixam de ver. Eles viram costas ao mundo exterior para encararem o mundo que está dentro de ti, que é tão ou mais vasto. Inspiras...expiras...uma e outra vez, num ritmo constante, num propósito meditativo. A respiração funciona como um ascensor, uma corda que fica pregada ao mundo desperto e pela qual deslizas, fornecendo-te uma passagem segura para os niveis mais inconscientes da tua mente.

São estreitos os caminhos que percorres e cheios de uma nebulosa escuridão que vais dissipando com a luz do teu raciocinio analitico, para que tu saibas identificar a resposta que precisas quando a encontrares. És uma equilibrista, dando passo por passo, atravessando esse limbo, em que de um lado está o mar da inconsciência e do outro o ceu da consciência. Meditas, respiras, na busca desse equilibrio vital, para que possas levar a tua consciência a embrenhar em reinos que não são da sua pertença.

No fim desse caminho vês uma árvore. Não é uma árvore qualquer. Ela é enorme, emanando um azul espectral. As suas raízes afundam-se num manto de escuridão, atingindo profundidades ainda maiores que aquelas a que já chegaste; raízes que conduzem à Origem. O seu tronco é amplo e musculado e as suas cascas evidenciam a sua longevidade milenar. A adornar os seus ramos estão os seus frutos, estranhos objectos luminescentes. E um deles, em particular, chama a tua atenção.

Aproximas-te da árvore e começas a trepá-la para alcançar esse fruto que apela por ti mais do que qualquer outro. Enquanto trepas juras sentir um forte e constante pulsar a reverberar no interior desse ser antigo. Um pulsar que ocorre em sintonia com o ritmo da tua respiração como se, na verdade, tu e essa árvore fossem uma só entidade. 

Quando o teu braço se estica para colher esse fruto de luz, percebes que ele é na verdade uma fotografia, uma imagem viva que corresponde a um determinado tempo e lugar da tua vida. O reconhecimento surge-te, então, de uma forma abrupta e violenta, enquanto seguras em contemplação esse momento que viveste na tua infância e que há muito tinhas esquecido. Mas nada é esquecido, nada se perde...

Tens nas tuas mãos a resposta à pergunta que colocaste e ela chama por ti. Agora não há retorno. O enorme poder dessa recordação chama por ti e tu deixas-te projectar, em entrega total, a esse momento já vivido para revivê-lo novamente. 

Como um pedaço de memória conjurado, focas a luz do teu entendimento para essa fugaz recordação e tentas com ela resgatar para o presente aquilo que ficou esquecido.  

sábado, 8 de dezembro de 2012

Um Caminho feito de Páginas em Branco

Estenderam-te um caminho feito de páginas em branco. 

Deram-te uma caneta e tu desenhaste a primeira página, então logo surgiu outra e percebeste que só havia uma direcção possivel e uma ação possivel. Ir em frente, desenhando. Movimento. 

Muitas páginas em branco transformaram-se em desenhos e juntos contavam uma história. Os desenhos ensinaram-te muito, eles ofereceram-te a experiência. Então para além da caneta que já possuías, ganhaste a percepção de veres a tua arte a aperfeiçoar-se e a desenvolver-se. 

Hoje, tens atrás de ti as páginas que criaste com o movimento da tua caneta, desenhos sob a forma de actos e pensamentos. Hoje, tens a certeza que, quando olhares para o caminho a percorrer novamente, vai estar lá mais uma página em branco. 

Tens a caneta e a página em branco aproxima-se...porque vida é movimento...e tu continuas a desenhar...

 ...Gan        

sábado, 1 de dezembro de 2012

Um Papel em Branco



Já se tornou rotineiro esse acontecimento. Um acontecimento que se repete por mais vezes do que aquelas que gostaria. 

Sento-me muito direitinho numa espaçosa cadeira. Daquelas que proporcionam o devido conforto ao corpo para que este, depois, não sirva de desculpa para desistências. Coloco os braços sobre a secretária onde uma folha em branco aguarda pacientemente pelo meu gênio criativo. Agarro a minha caneta favorita e, ao fim de poucos segundos, percebo que nem sequer as primeiras palavras sou capaz de traçar.

Num fenómeno que ocorre quase sempre da mesma forma, tentativa após tentativa, expiro exasperadamente enquanto uma onda de frustração me invade e me obriga, invonluntariamente, a batucar com os dedos no tampo da secretária. 

Controlo-me. Penso nos factores que possam justificar a presença desta barreira inoportuna que me impede de aceder à fonte criativa. No entanto, não existem grandes justificações quando percebo que essa barreira foi erguida por mim, mesmo que contra a minha vontade. 

Dentro e fora do meu quarto manifestasse o silêncio, esse bom companheiro. Não há nada que me possa distrair a não ser os meus inuteis pensamentos sobre a minha incapacidade de escrever. 

A ponta da caneta está suspensa escassos centimetros sobre o papel em branco, ameaçando e ameaçando... Mas por agora são ameaças vãs... O meu olhar permanece fixo no papel, ao ponto de quase o perfurar, caso o grau de concentração desse para tanto, tentando visualizar coisas que insistem em não se revelarem. 

Desisto. Levanto o olhar para os vários livros que repousam sobre as prateleiras da estante. O resultado também é desanimador. Nenhum deles oferece uma pequena ideia que seja para que formule esta penosa primeira frase. 

Minutos depois, apercebo-me que mal mudei de posição na cadeira e que nenhum pensamento válido consegue colorir sob a forma de palavras a página em branco. Porém, para não desistir uma vez mais, escrevo uma palavra. Uma palavra qualquer. Escrevo-a muito lentamente e na melhor caligrafia possível.    

Na minha mente, essa palavra assume uma forma, uma representação. Assim, no papel em branco que está no interior da minha cabeça, qual rascunho mental, existe uma imagem dessa palavra que vem substituir o branco do vazio. Outra palavra é escrita no papel e representada na mente. Esta relaciona-se com a anterior e cria uma ponte para as seguintes. Com mais algumas palavras acabo por estabelecer uma frase, que evidencia uma acção. Acções desencadeiam outras acções e, por isso, as frases seguintes surgem como consequências das anteriores. Uma história começa a ganhar forma. 

O papel já não está em branco. Da minha mão brota uma torrente de palavras cujo fluxo só é interrompido nos espaços em branco, entre palavras. De forma distante sinto o passar do tempo enquanto continuo na absorta tarefa de escrever...